sexta-feira, 9 de março de 2012

Hoje, para o horror dos comunistas mais ferrenhos, eu comprei um caderno da Coca-Cola, o que me fez pensar no que esses mesmos comunistas pensariam se soubessem que eu tenho um broche do Che Guevara ornamentando uma boina. Aqueles mais tolerantes, ou com melhor senso de humor, talvez achassem que estou desonrando um dos elementos de seu traje característico (pensei aqui em dizer que seria um “ultraje a rigor”, mas a ridicularidade excessiva da piada me fez deixa-la de lado – ops!). A maioria, contudo, tenho certeza de que me chamaria de poser. Tudo bem. Não posso negar que, à falta de um duplipensar aprimorado, tenho consciência das contradições que carrego nas costas como cidadão ocidental. Mas, também pelo meu próprio bom humor, confesso que acho bastante engraçado quem se esquece que também faz parte desse nosso ocidente pós-moderno e acredita que deixar de tomar Coca-Cola é o primeiro – e essencial – passo para se orquestrar – como maestroarranjador que é – a – oh! – revolução.

imagem que é um verdadeiro terror epistemológico para alguns mais sensíveis

Mas, como diria nosso querido Adorno, é tudo culpa do controle remoto. Ou algo assim. Porque com a popularização (e alguns diriam orkutização) de tudo, tudo virou um emaranhado de tudo. Marxismo atualmente (ou neo ou pós marxismo), quando é bem confundido, é confundido com comunismo; mas de maneira geral nego acha que marxismo é não comer no Mcdonalds (nosso refúgio contra o niilismo), não tomar Coca-Cola (que dirá comprar um caderno!) e andar de havaianas (que tão caras pra caramba).

sacanagem, Adorno!

Não que eu seja um daqueles que adoram brandir maldita inclusão digital ou algo assim, mas pra tudo tem limite. É preciso não só controlar a popularização do banal como também impedir a banalização das coisas mais complexas usando como pretexto a popularização. Como por exemplo, ver o Pedro Bial, vestindo o terninho de poeta, falar de feminismo num discurso de paredão no Big Brother.

nosso poeta engajado e intelectual orgânico

Aliás, nem é preciso o Bial bancar o poeta engajado (nos termos sartrianos) pra gente ver a banalização do feminismo, tanto entre seus opositores como entre seus defensores. Ou seus e suAs defensores e defensorAs, oração essa que é um belo exemplo do feminismo banalizado. Claro que é importante chamar a atenção para a hierarquização dos gêneros veiculada pela própria linguagem; mas fazer disso um credo e jihad ao ponto de ter ataques histéricos toda vez que alguém engloba todo mundo sob o gênero masculino é bobagem.

Da mesma forma, comemorar “por comemorar” o dia internacional da mulher é banalizar a data. Essa não é aquele dia pra dar os parabéns para todas as mulheres da sua família por elas terem tido a imensa felicidade de nascerem com dois cromossomos x. Essa é a data para lembrar de como as mulheres foram – e, absurdamente, ainda são – oprimidas por esses machismo e patriarcalismo babacas que insistem em andar de cabeça erguida quando deveriam ter sido varridos pra lata do lixo há muito tempo. E como apenas lembrar do passado quase nunca é suficiente pra resolver os problemas do presente, é o dia pra mostrar que a inferiorização da mulher ainda existe , e com muita força, e que isso precisa acabar o mais rápido possível. E se for possível, resgatando também um dos grandes propósitos do feminismo enquanto paradigma de pensamento, lembrar que não só as mulheres são vítimas de opressão, mas também os negros, gays, pobres, deficientes, etc., etc., etc., e que nada disso se justifica porque somos todos iguais.

é preciso sempre lembrar

Comemorar “por comemorar” o dia internacional da mulher me parece algo tão banal quanto passeata do orgulho hetero e coisas assim. É preciso sempre lembrar das razões para a existência de dias como esse para não correr o risco de que essas razões se dissolvam na euforia da comemoração em si. E para que por fim possamos viver numa sociedade mais justa e que já não necessite mais da existência de um “dia internacional da mulher”.